mardi 4 novembre 2008

ENTREVISTA AO PE. JOSÉ ANASTÁCIO

O prometido é devido. Na última edição do Chama Viva demos-lhe conta da chegada de um novo Missionário, na pessoa do Pe. José Anastácio, e comprometemo-nos a dar a conhecê-lo melhor através desta entrevista que aqui publicamos:

Chama Viva - Conte-nos rapidamente o seu percurso como sacerdote.
Pe. José Anastácio
- Fui ordenado padre na Sé do Funchal no dia 28 de Julho de 1990. Depois de estar 2 anos a estudar em Roma, regressei em 1992 à Madeira e desde então trabalhei sempre em paróquias, quer como pároco, quer integrado em «equipa» pastoral. A vida de padre tem sido para mim uma experiência muito gratificante, que espero poder enriquecer ainda mais, com a partilha da fé com os emigrantes no país que nos acolhe a todos.

Chama Viva - Sei que já lecionou no estrangeiro, mas a Suíça é a sua primeira experiência nas Missões. O que é ser Missionário hoje, em nome de Jesus Cristo?
Pe. José Anastácio
- As minhas experiências no estrangeiro forma sempre muito curtas: um ou 2 meses, no máximo. Algumas vezes fui para leccionar nos Seminários (Maputo e Dili); noutras estive com os emigrantes portugueses, por exemplo, em certas ocasiões festivas.
Considero que ser missionário é procurar, em cada ambiente concreto, continuar a missão de Jesus. É sentir-se enviado (aliás, a palavra «missionário» quer dizer simplesmente «enviado»). Foi Ele que mandou aos seus discípulos que vivessem a sua fé como missionários: «Ide por todo o mundo e anunciai a Boa Nova». Portanto, podemos ser missionários quando estamos na nossa própria terra, ou quando trabalhamos com os emigrantes ou ainda nas missões tradicionais em África ou no Oriente.

Chama Viva - Jesus Cristo confiou à Igreja, há 2000 anos atrás, a Missão de evangelizar todos os povos até aos confins extremos da Terra. Como se configura esta Missão hoje, no início do terceiro milénio, tendo em conta que devemos semear a palavra de Deus em meios hostis, de indiferença e violência, que tentam anular o bem ?
Pe. José Anastácio
- Naturalmente que, em cada época, a missão deve revestir características próprias desse tempo. Embora a tarefa da Igreja seja sempre a mesma (ou seja, anunciar Jesus Cristo e o seu projecto de salvação e libertação para todos), em cada época, ela precisa de estar atenta aos «sinais dos tempos».
O papa Paulo VI escreveu que «só há verdadeira evangelização quando a Igreja consegue ser fiel ao Evangelho e aos homens de cada tempo». Esta DUPLA FIDELIDADE é essencial em toda a evangelização: por exemplo, na catequese, na pregação, na atenção aos problemas das pessoas, etc. Se procuramos ser fiéis ao Evangelho mas não às pessoas do nosso tempo, as pessoas (sobretudo os jovens) não nos entendem, estamos a falar para o passado; mas se formos apenas fiéis ao tempo actual (às novidades) mas não ao Evangelho de Cristo, somos arrastados pelas modas e deixamos de evangelizar.
Se perdermos a «exigência» fundamental do Evangelho, que é o apelo à conversão, podemos tornar-nos num grupo como qualquer outro, uma espécie de clube de amigos, que é uma coisa interessante, sem dúvida, mas não é essa a missão da Igreja.

Chama Viva - Antigamente pensava-se que Missionário era aquele que partia para outras latitudes. A Europa enviava Missionários, não era território de Missão. No entanto, face às crescentes bolsas de paganismo, de abrandamento da fé, de situações de extrema pobreza e miséria, hoje já não é assim.
Pode dizer-se que hoje a Europa é território de Missão ? Mais, a Missão na Europa é uma realidade urgente ?
Pe. José Anastácio
- Na verdade, a terra inteira é terra de Missão. De modo especial a Europa. E até considero que a Missão na Europa é mais urgente e mais difícil do que em África. É que lá, quando chega o missionário, a sua presença é acolhida com alegria e entusiasmo, e depressa vê crescer o número de baptizados e de convertidos. Uma vez em Moçambique, estive numa celebração em que a maioria das pessoas ainda não era baptizada (a preparação para o Baptismo leva cerca de 3 a 4 anos) mas já ia todos os domingos à missa!
Na Europa, pelo contrário, todos acham que já nascem cristãos e já sabem tudo de religião. Pela minha experiência em Moçambique, vejo que uma criança ou adolescente em África, que anda na catequese e vai ser baptizada só aos 14 ou 16 anos, sabe mais de religião do que a maior parte dos nosso jovens e adultos que já foram crismados!
Portanto, na minha opinião, têm razão aqueles que pensam que a Europa de hoje é terra de Missão urgente! O problema é que, para a maior parte de nós, a fé é uma coisa quase morta, é como um prato sem gosto nem sabor, e isso torna mais difícil (mas mais urgente!) a Missão na Europa.

Chama Viva - Na sua Encíclica « Deus caritas est », o Papa Bento XVI reflecte sobre o facto de que cada comunidade cristã é chamada a fazer conhecer a palavra de Deus.
Diga-nos, Padre, de que forma poderemos fazer nascer um Missionário dentro de cada um de nós, cidadãos comuns ?
Pe. José Anastácio
- A primeira condição para cada um de nós se tornar missionário é tornar-se ouvinte da Palavra de Deus. O seguimento de Jesus faz-se, antes de mais nada, pela escuta. E as pessoas de hoje (não apenas as crianças e os jovens, mas também muitos dos adultos) têm muita dificuldade em escutar e em fazer silêncio. Gostamos de falar, mas não gostamos tanto de escutar, em especial nós portugueses: Portugal é o país da Europa que mais usa o telemóvel. Porquê? Porque gostamos muito de falar. É bom poder falar, mas é ainda melhor saber escutar. É por isso que Deus nos deu só uma boca, mas dois ouvidos, não é assim?
O segundo aspecto importante é o testemunho da vida e da fé. Para podermos ser missionários, na família, no trabalho, na escola, na comunidade, devemos escutar a voz do Senhor e dar testemunho sobretudo através da nossa vida. Já diziam os antigos: «o exemplo arrasta». Os pais (ou qualquer outro educador, seja professor, catequista, padre, etc.) falam sem precisarem de abrir a boca.
Por exemplo: se os pais mandam os filhos à catequese e vão com eles à Eucaristia, é como se dissessem: «filho, para nós a vida da fé e a participação na Missa é muito importante; é o momento mais importante da semana! Vamos dar-te o exemplo e depois, quando fores adulto, seguirás o teu caminho».
Mas se só os mandam à catequese e os levam logo para casa, não indo com eles à Missa, é como se dissessem: «despacha-te filho, que isto de vir todas as semanas trazer-te à catequese é uma grande maçada e a religião só interessa aos padres e às beatas. Eu quero é que faças depressa a primeira comunhão por causa da festa, que o resto não me interessa, nem tenho tempo para aturar o padre». Mesmo que os pais não digam nada, os filhos percebem perfeitamente se para eles Deus e a Igreja contam mesmo ou são apenas uma questão de tradição ou um pretexto para fazer uma festa com a família e os amigos!

Chama Viva - Vai ocupar-se essencialmente das comunidades de « La Côte », ou seja, Etoy, Morges e Nyon. Já teve oportunidade de contactar com essas comunidades. O que observou? Deparou-se com uma realidade nova e diferente daquelas a que está habituado?
Pe. José Anastácio
- É certo que já tive ocasião de contactar todas as comunidades onde irei trabalhar. Esta é, para mim, uma realidade nova. Como em todas as novas experiências que fazemos na vida, temos de aprender. A primeira coisa a fazer é, naturalmente, conhecer estas comunidades para melhor estar ao serviço da fé e da vida das pessoas que aí vivem. Nesta tarefa, eu conto sinceramente com a colaboração e o apoio de todas as pessoas que têm trabalho nos diversos sectores e serviços das comunidades. Todos são necessários e todos são importantes. E espero também que possam surgir outras pessoas disponíveis para dar a sua colaboração, onde houver necessidade dela. Costumo dizer que a Igreja ou a Comunidade não é uma estação de serviço ou um supermercado, onde cada um procura despachar-se o melhor que pode. A Comunidade é, antes de mais, uma Família, onde todos são responsáveis, embora cada um tenha a sua própria tarefa.

Chama Viva - Quer deixar uma mensagem para todos aqueles que têm neste momento o « Chama Viva » entre mãos, e as suas perspectivas para o futuro desta Missão no cantão de Vaud?
Pe. José Anastácio
- A mensagem que deixo a todos os leitores de «Chama Viva» é que procuremos arranjar tempo para cuidar desta luz pequenina mas fundamental que é a nossa Fé, apesar da vida tão cheia e tão difícil que é a vida do emigrante.
Se plantarmos flores ou uma árvore, mas não cuidamos delas, o nosso jardim transforma-se em mato! Se deixarmos de cuidar e de alimentar a nossa Fé, podemos continuar a baptizar os filhos ou a acender velas a Nossa Senhora, mas se calhar daqui a pouco o que nos resta será muita tradição, mas pouca Fé autêntica.
Se eu estou na cama de um hospital, não são as tradições da minha terra que me vão dar alento e coragem, mas a minha Fé em Deus, não é verdade? Eu gosto das tradições, elas são uma coisa muito bonita para qualquer povo, mas só a Fé verdadeira ilumina a nossa vida e nos anima e conforta em todas as horas.
José Martinho

Aucun commentaire: